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Episódios inéditos – A calculadora que não calculava e O Buda que ninguém mais verá

Ao longo de vários anos, Marcia Pavarini percorreu 167 países e territórios, em todos os continentes, passando por lugares inusitados, situações dramáticas e por vezes hilariantes. Hospedou-se nos mais simples e rudimentares Templos Tibetanos ao pé do Himalaia; visitou remotas tribos perdidas no tempo; presenciou rituais em Ilhas quase desconhecidas; deslizou sobre trenós, no Ártico, na pista dos ursos polares. Participou de uma expedição à Antártica onde visitou as centenárias cabanas dos primeiros exploradores da região, mergulhou na África do Sul para apreciar os tubarões brancos de dentro de uma jaula; participou de vários safáris fotográficos pela África e muito mais, registrando cada viagem em diários. No entanto, sua experiência mais marcante foi durante o período em que morou no Iraque, convivendo com as atrocidades da guerra com o Irã, com a angústia do auto flagelo da população e o drama da auto mutilação dos jovens iraquianos para evitar o alistamento no exército militar. Marcia Pavarini divide aqui, suas experiências com os internautas do Portal na coluna “Diário das mil e uma viagens”.
Episódios inéditos extraídos dos diários de viagem  de Marcia Pavarini
Por Márcia Pavarini


A CALCULADORA QUE NÃO CALCULAVA
Bali

Legian Street
A Legian Street, no bairro de Kuta, é um dos pontos de comércio mais aquecidos de Bali. Em quase todas as lojas há um balcão de câmbio de moedas estrangeiras. Atraídos por valores bem acima dos oferecidos pelos bancos oficiais, os turistas costumam cair em pegadinhas típicas. Uma delas é o cambista fazer a troca devolvendo 15% a menos, o que dá no mesmo câmbio dos bancos. Se descoberto, ele justifica dizendo que é comissão. Se você não aceitar, ele desfaz o negócio. Outra é entregar uma montanha de notas de pequeno valor, apostando que você não terá paciência de contá-las até o fim e descobrir que (mais uma vez) faltam os 15%. Se reclamar, ele pega de volta, alegando que não tem cédulas de maior valor.
Apesar de conhecer bem os dois golpes, caí num terceiro, absolutamente inesperado. Quando o cambista perguntou quanto eu queria trocar ofereceu sua calculadora e eu mesma fiz as contas. Só quando cheguei ao hotel percebi que faltavam 100.000 rúpias! Quem, afinal, imaginaria uma calculadora adulterada?

O BUDA QUE NINGUÉM MAIS VERÁ
Afeganistão 1979

Buda de Bamiyan

Foi preciso falar muito em Pelé e café a fim de conseguirmos permissão dos militares para visitar o Vale de Bamiyan (foto abaixo), no Afeganistão. O Vale de Bamiyan está situado nas rotas das caravanas entre a Índia e a Ásia Central e foi berço de diversas culturas, onde floresceu o Budismo antes da difusão do islamismo, o que justifica a presença da fenomenal estátua de Buda. O gigantesco Buda, de 60 metros de altura, esculpido em um nicho de 8 metros de profundidade, fora entalhado diretamente na rocha, nos séculos IV e V a.C. Seu rosto e mãos eram, originalmente, recobertos de ouro.
 
Finalmente, o general autorizou a visita, mas com a condição de que voltássemos no mesmo dia, pois ele não poderia garantir nossa segurança. Acordamos às 6h30 e corremos para o aeroporto. Éramos os únicos turistas. Não só do avião como, talvez, do próprio país, já que a situação do Afeganistão era bem complicada.
Ao desembarcarmos, fomos recebidos por vários militares que, cordialmente, vieram dar as boas vindas e, ao mesmo tempo, saber “que diabos estávamos fazendo lá”. Um deles mandou que esperássemos sem dizer o porquê. É que não poderíamos sair para visitar o tal Buda sem um esquema de segurança, embora a estátua ficasse a apenas 20 minutos a pé da base. O comandante forneceu, então, um jipe com motorista e dois soldados armados com metralhadoras. E lá fomos nós para o city tour mais esquisito do mundo. Enquanto caminhávamos aos pés do Buda, notamos muitos cartuchos de balas pelo chão. Perguntei ao oficial se havia acontecido algum combate ali. Embaraçado, ele explicou que o local era usado como campo de treinamento de tiro. Fiquei me perguntando se o alvo não seria a cabeça dos rebeldes. Da estátua do Buda de Bamiyan, relíquia admirada por Alexandre Magno e comentada por Marco Pólo, sobraram apenas os escombros. Há alguns anos, fanáticos rebeldes do Taleban explodiram a estátua, após tomarem o poder na região, por encará-la como heresia ao islã. Acho que fomos um dos poucos turistas ocidentais que tiveram o privilégio de vê-la.
Veja no próximo episódio:
CUIDADO! UM GREGO NO VOLANTE, CORRE QUE LÁ VEM
O TOURO e UM DESCUIDO PODE DAR MER…

Márcia Pavarini

Marcia Pavarini é advogada de profissão, fotógrafa e apaixonada por viagens. Compartilha suas andanças pelo mundo no Diário das 1001 Viagens.

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